Para falar do PRECONCEITO,
poderíamos partir da etimologia da palavra definida segundo o site http://www.etimologista.com/ a seguir:
“A palavra preconceito é formada
pelo prefixo latino “pré” (anterioridade, antecedência) mais o
substantivo “conceito” (opinião, reputação, julgamento, avaliação).
O preconceito é, portanto, o conceito formado antes de se ter os conhecimentos
necessários; é a opinião formada antecipadamente, sem maior ponderação.”
Mas a compreensão do preconceito exige um
entendimento que vai além, muito além da etimologia...
O ser humano tem arraigado em si mesmo e em sua
natureza um dos mecanismos mais profundos de autopreservação conhecidos: o
MEDO!
O medo do desconhecido e de tudo aquilo que não
se mostra passível de controle simplesmente apavora o ser humano.
O medo quando entra na composição prioritária da
constituição da forma de um ser humano vislumbrar a própria existência e do
mundo em que se insere, pode gerar uma forma de ação e reação e, não menos
importante, de construção de seu próprio psiquismo e de sua concepção do alheio
aos seus costumes.
Não menos importante do que a construção do
psiquismo e da identidade o indivíduo diante do mundo em que se insere, vem a
construção da realidade sociológica do espaço em que se insere.
Desde os primórdios da humanidade, o poder se
manteve circulante entre os entes de mesmo meio através da manutenção dos
conceitos de superioridade desta ou daquela característica, seja ela genética
ou de identificação sociológica. Desta forma, espartanos versus atenienses,
gregos versus romanos, arianos versus negros, homens versus mulheres, heteros
versus gays e tantas outras formas de comparativos de divergências
sociológicas, étnicas, de gênero, de identidade sexual, religiosa ou, seja lá o
que for, serviram de argumento e ferramenta para as maiores barbáries da
história da humanidade.
O fato é: existe um imenso paradoxo envolvendo
tudo isso. Ao mesmo passo que o ser humano é um ser social e DEPENDE emocionalmente
e sociologicamente de sua identidade de grupo, ele também tem a necessidade
feérica de manutenção de sua própria condição dentro de um padrão de
aceitabilidade e normalidade. Assim, da mesma forma que o ser humano NECESSITA
se ver inserido no todo em sua completude, também NECESSITA da manutenção do
grupo no qual se insere e com o qual se identifica dentro dos padrões do
aceitável como padrão de normalidade. Ocorre que, a maior parte das construções
sociais foram fundamentadas na lei do mais forte, ou seja, civilizações
inteiras foram construídas em cima de uma ideia de supremacia, intolerância e
direito escravizador sobre entes DIFERENTES.
Assim, se uma civilização inteira fundamentou seu
desenvolvimento na ideia da superioridade de um ente sociológico sobre outrem,
é fato que cria-se uma REALIDADE de construção sócio-cultural-filosófica em que
esses elementos de suposta supremacia se tornam mais do que fundamento de
estrutura social, estrutura do psiquismo pessoal e coletivo criando tabus e “verdades”
transmitidas ao longo das gerações (seja por compartilhamento de tradição oral
ou por exemplificação, ou mesmo por transferência cultural e educacional
instituída) perpetuando-se ao longo dos séculos.
Existem civilizações inteiras para contar essa história
mas, vamos abordar a realidade sociológica do universo em que estamos
inseridos.
O Brasil, país e dimensões continentais e de
diversidades compatíveis com suas dimensões deveria ser, de acordo com a lógica
da totalidade que se constrói nesta infinidade de influências é um exemplo
clássico do quanto a construção a manutenção do poder pode gerar a raiz do
preconceito desenvolvê-la mesmo que veladamente.
Em seu descobrimento, o Brasil passou por um
processo de colonização pelas mãos portuguesas. Mas quem eram os portugueses?
Um país pequeno, acuado e cheio de pretensos inimigos, precisando
desesperadamente manter sua supremacia e expandir seus domínios. Assim sendo,
que forma melhor do que a força? A força sobre o mais fraco e o domínio do
diferente. Na participação portuguesa na constituição histórico-cultural e
sociológica do Brasil, vemos uma herança de soprepujança do português sobre as
nações africanas e indígenas, e a construção de uma nação inteira regada no
sangue e no uso abusivo da força.
Neste processo, a segregação do diferente se fez
tão presente que se arraigou em nossa sociedade como parte constitutiva e
matriz de nosso subconsciente coletivo de duas formas absurdamente expressivas:
Fundamentou no branco a ideia da supremacia e do
direito à um posto de superioridade absoluta sobre o negro e o índio a despeito
de sua condição igualmente humana, assim como fundamentou no negro e no índio a
posição de ente em eterno estado de ameaça por sua condição diante do todo
opressor.
Inexorável paradoxo entre a pujança do opressor
por simples MEDO do oprimido, e de MEDO do oprimido que perpetua a diferença em
vez de contemplar a similaridade.
Sim... nada serve como alimento do preconceito
que permeia a sociedade mais do que o MEDO. Mas o medo que alimenta essa
situação construtora de guetos invisíveis não vem apenas do opressor inicial.
Passa a se fazer constante e fertilizador de discriminação massiva quando o
oprimido em vez e utilizar-se de um posicionamento massificante do homem pela
sua condição de parte da humanidade como um todo, passa a utilizar-se de
estratagemas que muito longe de garantir a desmistificação da diferença (que
biológica e geneticamente é ínfima) perpetua o culto à diferença em ações que
perpetuam e celebram o culto à diferença e a “guetização” da sociedade como um
todo.
Diferente do esperado em um trabalho sobre o
preconceito, não irei aqui exaltar a benesse dos negros na construção desta ou
de outra nação, nem exaltar o verdadeiro banho de sangue negro derramado pela
ignorância e pela ganância do homem branco ao longo da história, mas, sem
dúvida alguma, deixo aqui o mais profundo pesar pela existência do culto à raiz
e um dia da consciência negra, azul, rosa ou amarela, quando o que nos falta é
o culto à humanidade como um todo, dos primórdios hominídeos ao dia de hoje, a
exaltação da vida em sua totalidade e a reconstrução da consciência humana, em
que não se estabeleça o ser humano em seu nicho de acordo com sua etnia mas em
acordo à sua condição de ser em processo de evolução que veja a qualquer membro
dessa espécie a qual pertencemos como parte integrante e vital à preservação e
construção de um conjunto social complexo e justo que priorize a vida e não a
exaltação de suas nuances.